Você tem que estar preparado para se queimar em sua própria chama: como se renovar sem primeiro tornar-se cinzas?
(F. Nietzsche)

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Sobre hoje

Querido Caos,

acabei de acordar e já não entendo mais nada, há pouco parecia ter uma cama aqui, mas são apenas lençóis jogados no chão e um travesseiro feito com mais lençóis. Resolvi te escrever já nesse despertar pra não esquecer o sonho. Prometi que quando sonhasse contigo, de imediato te relataria, e aqui vai: estávamos nós dois num mundo isolado onde não havia tempo certo, só o agora, tinha mais terra do que mar, mas não parecia visto de cima, podíamos também voar, e voávamos sempre, quase não me lembro de termos andado. Dava um frio na barriga toda vez que nos olhávamos e nos percebíamos suspensos no ar, era como se nos reconhecêssemos num espelho, espelho nosso. Exatamente como esse espelho que você deixou pra mim antes de ir embora que agora só serve de moldura pra um mosaico de fotografias de estranhos que ando tirando nos raros tempos livres que me obrigo a aproveitar. Você dava piruetas e cambalhotas enquanto eu checava as esquinas e quinas pra que você não se machucasse. Certo agora, você parou e desceu, reparou num muro solto no meio do nada, que insistia em ficar de pé quando todo o resto já era pedregulho. Nesse muro tinha uma janela e era oca, dava pra ver os cupins fazendo o trabalho direitinho. Depois disso ficou tudo meio embaralhado, você me perguntou se eu ainda queria trocar o trinco da porta e eu disse que trocaria a porta inteira logo, você sorriu e desatou a dar piruetas de novo até sumir entre as nuvens que já anunciavam mais chuva. Chovia sempre, mas tinha mais terra do que mar. Então eu acordei. E eu juro que tinha uma cama aqui, só que é a do outro quarto ao lado, o meu. Outra vez, dormi no teu chão. Acho que é só isso mesmo, eu e você voando, muro, janela e cupins, e chuva. Estou mandando aí uma cópia da chave, está tudo em ordem, aparece.

Quase seu,
 Equilíbrio.

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