Você tem que estar preparado para se queimar em sua própria chama: como se renovar sem primeiro tornar-se cinzas?
(F. Nietzsche)

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Dores verdes

De vez em quando eu vou ficar esperando você numa tarde cinzenta de inverno, bem no meio duma praça, então os meus braços não vão ser suficientes para abraçar você e a minha voz vai querer dizer tanta, mas tanta coisa, que eu vou ficar calada um tempo enorme, só olhando você, sem dizer nada, só olhando e pensando: "meu Deus, mas como você me dói de vez em quando..."

Texto de Caio F.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Desencontros

yasmin s.


Não é triste pensar que quanto mais interessante uma pessoa é,
menor a chance de você vê-la andando por aí?



Nunca pensei se a conheceria um dia, pois não me interessava conhecê-la ou não,  tampouco me portei robusto ao apertarmos as mãos. Foi um "muito prazer" desinteressado, desses que são jogados ao vento e que nunca mais a gente acha porque nem procura. Também não importava se a veria de novo, nunca fiz muita questão em manter laços, principalmente, com quem não mostra interesse em mantê-los. Fico eu cá, ela lá, e tudo se ajeita, amanhã ninguém nem lembra, pensei. Outro encontro, dois beijinhos no rosto, o de praxe, até quis achar estranho, mas é que talvez fôssemos tão irrelevantes um pro outro que não fazia diferença, pura educação, amigos em comum, tinha que ter mesmo aquela postura, fingir que ouve, fingir que fala. Eu cá, ela lá.

Numa noite dessas que a gente sai de casa por pura teimosia, clima de chuva, preguiça, quando ninguém tá afim de ir por achar que não vai dar ninguém na festa, onde todo mundo se encontra e se espanta, "você veio!", copo já na mão, papo furado com gente alheia, amigos cheios daqueles benditos esquemas, outros se jogando na pista de dança, uma amiga num canto mais reservado conversava com ela. Tudo levava minha atenção para aquele canto, sem qualquer motivo aparente, tinha mais luz, ou um lugar pra sentar, ou o bar ao lado, ah, eu queria mesmo uma bebida. "Oi", apertou minha mão, e continuou a conversa. Eu teria saído logo dali, era só mais uma para cumprimentar, missão cumprida. Só que parei pra ouvir e junto veio o parar pra olhar com o parar pra ver, cada palavra era uma surpresa, um pequeno choque a me despertar, percebi o quanto ela era interessante, ou o quanto eu já tinha me interessado, não só para uma festa, mas para uma tarde com sorvete ou cinema, ou simplesmente para uma tarde, uma manhã, uma noite. Não tinha copo na mão, mas já estava bêbada, e mesmo assim me cativava, me dava vontade de sair daquela festa, voltar ao "muito prazer" e dar toda a intensidade merecida com um típico "te conheço de algum lugar", porque a conhecia mesmo, conhecia tanto que evitava conhecer mais de perto. Era diferente e talvez eu sempre soubesse disso, mas mesmo assim me surpreendia ao ouvi-la falar, a voz mansa, os gestos sutis ao ajeitar a blusa e os cabelos, a convicção bagunçada ao falar: tudo me envolvia, o que me fez sair dali na tentativa de manter a irrelevância dos encontros que essa vida faz, pois a última que me apareceu deu tanto trabalho com esse lance de romance. E eu já sonhava com ela. Sim, era para sair dali às pressas, antes que tudo saísse do controle. Que continuasse, então, o acordo: ela lá, eu cá.

A noite estava boa, nem quente nem fria, bons goles, tequila, cerveja, vinho, gente indo e vindo, gente sumida aparecendo, gente sumindo. Em meio aquilo tudo, ela dançava como uma criança tímida e desengonçada, ou feito uma mulher sensual e misteriosa, que deixa curiosidade em cada passe, não dava pra definir direito. Não tinha nada de romance ali, éramos desconhecidos de apenas "oi" afinal, mas novamente arrisquei me aproximar, pois me parecia ser a pessoa mais próxima a mim naquela noite. Fingindo que não a via, que não havia nada demais naquela festa, embora ela já fosse tudo, eu a observava de canto de olho, ela parecia não querer nada com ninguém, só dançar, beber, curtir, viver, morrer. Cansada, talvez, ou embriagada demais, sentou-se ao meu lado, nos olhamos por algum tempo, alguns beijos nas mãos, completamente bêbados. Beijos e olhares alcoólicos, como se nos conhecêssemos há muito tempo e não precisássemos dizer nada, eu cá, ela lá.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Do lápis e da borracha

Te escrevi e te gastei as minhas melhores palavras, as quais aos poucos foram recolhidas numa pasta ao fundo da gaveta e talvez, em breve, sejam queimadas pelas mágoas que o tempo cura, mas não dá tempo de curar. O que me conforta, ou alivia, é saber que no final de tudo, as palavras é que ficam, que pra todo começo há o recomeço, que mesmo eu não valendo nada pra ti e para os outros, ainda posso escrever, e é por essa minha mania barata e boêmia que você sempre volta e recolhe cada pedacinho de cinza, faz um quadro e ilumina mais um canto do teu recanto desencantado. É em cada vírgula ou ponto final que tento traduzir o que não sei mais dizer quando quebro a sensação a ser transposta que você sente a necessidade de voltar e me dizer em alto e bom tom o que precisa ser dito, ou contradito, na tua crueza que não enxergo, ou não assumo. E são nessas tuas palavras, que prefiro nem escutar mais, que me fazia toda tua, gastava outra vez versos mal feitos e contos longe de serem de fadas, praticamente jogava fora o que outros abraçariam para si num olhar que eu procurava a todo custo arrancar de ti, me arrastando cega pelas madrugadas, a te buscar seja lá onde fosse. Quer dizer, até escutaria, mas como você, elas vem em vão, logo se vão, e eu já percebi o quanto tem de gente pra dizer as mesmas coisas e que dão crônicas bem mais delicadas. Já disse que adoro os pretéritos do nosso tempo? Outro dia, estive pensando que os rejeitados, esses poetas que viram copos noites adentro, que jogam rimas ao vento, talvez sejam mais sortudos que seus amores. Andei lendo cartas avulsas, versos quebrados, frases em guardanapos. Felizes desses que choram suas lágrimas no papel, quanta beleza a ser lida e sentida noutros tempos, doutros amores! Vou lá também, escrever baixinho pra você ouvir de longe, quase um eco, me afastando cada vez mais, pra mexer com teus sentidos, manter tua mente, que de paixões às vezes quer distância, sutilmente insana, por mim ou não. Porque, meu amor, dentre tantos outros amores, tudo passa sim, o que não se pode deixar passar é essa loucura que é estar apaixonado, se fechar num deserto que parece porto seguro, mas é vela solta em mar que não tem peixe nem vento nem céu azul. Meu bem, inspiração é o que faz essa vida andar pra frente e flor é o que não falta pra admirar. Do meu caderno, já fiz borrão, e se não tiver tempo pra passar tudo a limpo, apago ou escrevo por cima.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Da melancolia à poesia

Sabe aqueles dias, de Domingo talvez, que você quer simplesmente sumir do mundo porque está tudo errado, fora do lugar, sem rumo e sua vida não passa de um dia que amanhã nem vai ter existido? Então vem aquela vontade de sair pra tomar um sorvete, chamar uma pessoa qualquer, um amigo distante, um rolo sem expectativas, apesar de não estar com vontade de ver ninguém, e você convida. Um não pode, outro não atende, esse não está, ela não quer mais sair contigo, mas aquela está de bobeira e aceita. Vocês saem ao acaso, por um sorvete ou por uma tarde de meio sol, conversam sobre o vazio da manhã, preenchem o início da noite com a ingenuidade de um encontro que começou sem destino algum, encerram a madrugada cheios de si e talvez algum tempo depois falem sobre o acaso desse destino ou sobre o destino desse acaso de um dia nostálgico que os levou da melancolia à poesia.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

De um carnaval sem Fevereiro

A gente ria tanto
desses nossos desencontros
Mas você passou do ponto
e agora eu já não sei mais...

Mais uma noite
Dessa vez não tão fria
aquecida entre travesseiros
nem mais, nem menos
um tanto vazia
e alguns poucos pensamentos

Quando ríamos nas madrugadas
da minha vida vadia
das nossas desavenças
do jeito inquieto de amar
e frouxo de odiar
eras tão mais serena

Ah, minha pequena!
Hoje em dia
ora quem diria!
Essa troca de faces
Esse tal de celibato
e teus novos atos,
tão gastos e sem disfarces,
não nos deixam nada mais
do que o tempo já já desfaz

Meu cansaço e teu tédio
sem máscaras de Fevereiro
E a dor de um pré-carnaval
sem remédio.