Você tem que estar preparado para se queimar em sua própria chama: como se renovar sem primeiro tornar-se cinzas?
(F. Nietzsche)

quinta-feira, 10 de março de 2016

Mud'alma

Às vésperas de mais uma mudança, fico aqui pensando nessa facilidade que eu tô tendo de me desenraizar dos espaços; antes, eu achava que seria difícil colocar tudo numa caixa e vivenciar a vida entre quatro outras paredes, sem nem uma alma minha, agora, chego a nem tirar todas as coisas das caixas, chego a nem perceber as paredes, nem a pensar duas vezes antes de me deslocar mais uma vez. A qualquer momento, pode ser outro corpo noutro lar. Em menos de um ano, aprendi a me desapegar de tudo aquilo que estive agarrada desde sempre, por uma vida ou alguns minutos. - Essa casa nunca foi minha, o coração é que me faz moradia - e vai. Também achei que sentiria mais dó daquilo que pudesse ser perdido, mas  o que vai se perdendo, e muita coisa vai se perdendo, não se perde, não se sente. Quando a gente se muda, tudo na gente muda também, inclusive os apegos.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Sem continuação

Quis se desesperar pelos últimos acontecimentos trágicos afetivos naufragantes em que se metera, pra variar. Outra vez, aquele mesmo dar-sem-receber, o ter cuidado sem ser cuidado, mas então lhe veio um torpedo à mente como quem dá um tapa na cara depois de puxar a ponta da orelha: ora, pra quem deixou vinte anos pra trás sem sequer buscar rastros do caminho de volta, o que seriam aqueles poucos meses e minutos que não lhe desenharam nem uma risca no chão que vinha pisando na ponta dos pés? Nem atalho, nem ponte, nem travessia nenhuma, só um corte numa estrada que ainda nem começara a ser pavimentada. Pegou o primeiro livro que viu pela frente, colocou na cabeceira, ligou o rádio e dormiu. Pensava que era amor, mas era cansaço.