Você tem que estar preparado para se queimar em sua própria chama: como se renovar sem primeiro tornar-se cinzas?
(F. Nietzsche)

domingo, 24 de setembro de 2023

Aqueles olhos

M.

No mesmo lugar
Parada
Como nunca, como sempre
Agora vendo sob tuas íris 
Novas paradas
De novas partidas
Pelos mesmos caminhos
Mas com outros andares
Desassossegada
Espero a chegada
Lá onde sempre estivemos.

domingo, 17 de setembro de 2023

O muro

        Eu sentia que precisava subir naquele muro por algo que havia ainda de saber do lado de cá. Deitada na cama à noite, sempre ouvia o vento e as fagulhas de areia que pintavam no telhado, e pensava: o que haverá no lado de lá? Num dia qualquer, em desgraça ou benção, de sol a pino e pinga na mão, tomei coragem, um gole e um impulso: me escalei. Lá estava, paisagem à toa, sem eira nem beira, como quem diz: é, há quem queira! Mirei alguns instantes, como quem tenta dar valor ao que já fora tão estimado, mas não vi sequer cor naquele mato que, há poucos dias, havia incendiado. Ao tentar descer do muro, uma perna afrontou a outra e quase fui abaixo; joguei o corpo antes e dei de cara no chão: me estrepei. Apesar desses pesares, a vista valeu a pena e cada arranhão marcou a certeza de que nunca mais na vida haveria de encarar subida nem encanto que viesse por curiosidade.

quarta-feira, 13 de setembro de 2023

Céu

Como um pássaro 
que pousa no canto da calçada
ao acaso 
e encontra algumas migalhas 
espalhadas pelo chão. 
Depois de um tempo 
vê uma mão estendida ao vento
pedaços de pão, 
colhendo qualquer ave 
que ali chegue mais perto. 
O pássaro, livre, 
se ilude com o alimento despedaçado, 
acostuma-se, 
volta no outro dia, 
e no outro dia, 
e no outro. 
Despercebido, prende-se. 
Assim é o teu amor, 
um corte ao que era instinto.
Assim eu era pássaro.

Andarilha

Coleciono chaveiros

De viagens 

Que nunca fiz.