Você tem que estar preparado para se queimar em sua própria chama: como se renovar sem primeiro tornar-se cinzas?
(F. Nietzsche)

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

As luas de lua

 para Lorena Maia.

Cheia de si e de tudo, até a lua estava cheia. O tédio a tomava em grandes goles lentos quando tudo parecia apenas mais um final de tarde que costurava o nada de seus dias com pontos falsos. Como se parasse de acompanhar os ponteiros do relógio, imergiu numa contagem desmedida. Lembrou-se de antes de tudo, da delicadeza dos tempos, da promessa silenciosa feita aos prantos que a partida causa. Lembrou-se de quando prometia, mesmo sabendo que muitas vezes não era de cumprir, mas perdoada feito criança. Lembrou-se de quando acreditava em boas intenções e de quando elas eram de fato verdadeiras. Essa tarde adormecia mais do que o sol, adormecia também um coração no canto do sofá antigo, acolhido pela tv e pelo prato de sopa morna. Não estava totalmente cansada, pois ainda lembrava-se de outros pores do sol e luas cheias, menos nostálgicos, menos coveiros. Também não estava descansada, o que a mantia no sofá era um sentimento desconhecido, mas familiar. Lembrar-se não era exatamente o que a enchia, é que tocava o vazio de tal forma que preenchia algo ali. E era incômodo. Como uma bolha cheia de ar. Lembrou-se do que havia esquecido, a lua cheia perdida na praia, a lua minguante sorrindo embriagada. O pôr do sol nunca visto. Estava cheia, pesada, inerte. Mas ainda havia algo em sua memória que a fazia flutuar pelos espaços da casa e a levavam pra longe dali, onde o tempo sonha. Ainda tinha as estrelas.

Um comentário:

T.C. disse...

chamas de lembrança
são cinzas de uma ideia fixa