Você tem que estar preparado para se queimar em sua própria chama: como se renovar sem primeiro tornar-se cinzas?
(F. Nietzsche)

segunda-feira, 20 de julho de 2009

O reflexo e o reflexo.

Ela acendeu a luz com repentina euforia de quem acorda após a prisão de um pesadelo. Os seus olhos vagantes procuravam algo naquele quarto que lhe parecia estranho, mas a tranquilidade de seus toques pelos móveis que a sustentavam mostrava que já não havia motivo algum pra toda aquela exaltação em meio à madrugada. Ao olhar por entre seus cabelos ainda agitados encontrou alguém que há tempos não via. A imagem refletida no espelho antigo e de moldura escura mostrava plenamente uma pessoa desgastada pelo tempo. Ela quis evitar tal encontro, pensou em desviar-se de si mesma, mas sabia que não adiantaria, o espelho estava ali reluzente. Os olhos daquela imagem pareciam sofridos, aquela boca implorava calada algo indecifrável; decifra-me ou te devoro! dizia. E, assim, o tempo ia devorando sorrateiramente as expressões de sua vida frívola. Por um instante, algo escorreu em seu rosto, teve dúvidas. A lágrima desceu seca, não pode chegar ao fim de seu percurso, logo desaparecera. Ela virou-se. Pôs-se em outras formas. Não adiantaria, sua imagem refletia tal qual realmente era. O espelho, marcado pela ferrugem, era sábio. Ela, sempre disfarçada, ingênua. Confundiu-se com a noite, as horas desordenadas, adormeceu anestesiada. Ao acordar, exatamente às 6 da manhã junto ao despertador colado à cama, após hesitar por alguns segundos, levantou-se, pegou o estojo que encontrava-se na mesinha abaixo do espelho e, admirando-se no espelhinho traçado delicadamente por linhas douradas, alinhou-se.

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