Você tem que estar preparado para se queimar em sua própria chama: como se renovar sem primeiro tornar-se cinzas?
(F. Nietzsche)

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Do lápis e da borracha

Te escrevi e te gastei as minhas melhores palavras, as quais aos poucos foram recolhidas numa pasta ao fundo da gaveta e talvez, em breve, sejam queimadas pelas mágoas que o tempo cura, mas não dá tempo de curar. O que me conforta, ou alivia, é saber que no final de tudo, as palavras é que ficam, que pra todo começo há o recomeço, que mesmo eu não valendo nada pra ti e para os outros, ainda posso escrever, e é por essa minha mania barata e boêmia que você sempre volta e recolhe cada pedacinho de cinza, faz um quadro e ilumina mais um canto do teu recanto desencantado. É em cada vírgula ou ponto final que tento traduzir o que não sei mais dizer quando quebro a sensação a ser transposta que você sente a necessidade de voltar e me dizer em alto e bom tom o que precisa ser dito, ou contradito, na tua crueza que não enxergo, ou não assumo. E são nessas tuas palavras, que prefiro nem escutar mais, que me fazia toda tua, gastava outra vez versos mal feitos e contos longe de serem de fadas, praticamente jogava fora o que outros abraçariam para si num olhar que eu procurava a todo custo arrancar de ti, me arrastando cega pelas madrugadas, a te buscar seja lá onde fosse. Quer dizer, até escutaria, mas como você, elas vem em vão, logo se vão, e eu já percebi o quanto tem de gente pra dizer as mesmas coisas e que dão crônicas bem mais delicadas. Já disse que adoro os pretéritos do nosso tempo? Outro dia, estive pensando que os rejeitados, esses poetas que viram copos noites adentro, que jogam rimas ao vento, talvez sejam mais sortudos que seus amores. Andei lendo cartas avulsas, versos quebrados, frases em guardanapos. Felizes desses que choram suas lágrimas no papel, quanta beleza a ser lida e sentida noutros tempos, doutros amores! Vou lá também, escrever baixinho pra você ouvir de longe, quase um eco, me afastando cada vez mais, pra mexer com teus sentidos, manter tua mente, que de paixões às vezes quer distância, sutilmente insana, por mim ou não. Porque, meu amor, dentre tantos outros amores, tudo passa sim, o que não se pode deixar passar é essa loucura que é estar apaixonado, se fechar num deserto que parece porto seguro, mas é vela solta em mar que não tem peixe nem vento nem céu azul. Meu bem, inspiração é o que faz essa vida andar pra frente e flor é o que não falta pra admirar. Do meu caderno, já fiz borrão, e se não tiver tempo pra passar tudo a limpo, apago ou escrevo por cima.