Você tem que estar preparado para se queimar em sua própria chama: como se renovar sem primeiro tornar-se cinzas?
(F. Nietzsche)

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Desencontros

yasmin s.


Não é triste pensar que quanto mais interessante uma pessoa é,
menor a chance de você vê-la andando por aí?



Nunca pensei se a conheceria um dia, pois não me interessava conhecê-la ou não,  tampouco me portei robusto ao apertarmos as mãos. Foi um "muito prazer" desinteressado, desses que são jogados ao vento e que nunca mais a gente acha porque nem procura. Também não importava se a veria de novo, nunca fiz muita questão em manter laços, principalmente, com quem não mostra interesse em mantê-los. Fico eu cá, ela lá, e tudo se ajeita, amanhã ninguém nem lembra, pensei. Outro encontro, dois beijinhos no rosto, o de praxe, até quis achar estranho, mas é que talvez fôssemos tão irrelevantes um pro outro que não fazia diferença, pura educação, amigos em comum, tinha que ter mesmo aquela postura, fingir que ouve, fingir que fala. Eu cá, ela lá.

Numa noite dessas que a gente sai de casa por pura teimosia, clima de chuva, preguiça, quando ninguém tá afim de ir por achar que não vai dar ninguém na festa, onde todo mundo se encontra e se espanta, "você veio!", copo já na mão, papo furado com gente alheia, amigos cheios daqueles benditos esquemas, outros se jogando na pista de dança, uma amiga num canto mais reservado conversava com ela. Tudo levava minha atenção para aquele canto, sem qualquer motivo aparente, tinha mais luz, ou um lugar pra sentar, ou o bar ao lado, ah, eu queria mesmo uma bebida. "Oi", apertou minha mão, e continuou a conversa. Eu teria saído logo dali, era só mais uma para cumprimentar, missão cumprida. Só que parei pra ouvir e junto veio o parar pra olhar com o parar pra ver, cada palavra era uma surpresa, um pequeno choque a me despertar, percebi o quanto ela era interessante, ou o quanto eu já tinha me interessado, não só para uma festa, mas para uma tarde com sorvete ou cinema, ou simplesmente para uma tarde, uma manhã, uma noite. Não tinha copo na mão, mas já estava bêbada, e mesmo assim me cativava, me dava vontade de sair daquela festa, voltar ao "muito prazer" e dar toda a intensidade merecida com um típico "te conheço de algum lugar", porque a conhecia mesmo, conhecia tanto que evitava conhecer mais de perto. Era diferente e talvez eu sempre soubesse disso, mas mesmo assim me surpreendia ao ouvi-la falar, a voz mansa, os gestos sutis ao ajeitar a blusa e os cabelos, a convicção bagunçada ao falar: tudo me envolvia, o que me fez sair dali na tentativa de manter a irrelevância dos encontros que essa vida faz, pois a última que me apareceu deu tanto trabalho com esse lance de romance. E eu já sonhava com ela. Sim, era para sair dali às pressas, antes que tudo saísse do controle. Que continuasse, então, o acordo: ela lá, eu cá.

A noite estava boa, nem quente nem fria, bons goles, tequila, cerveja, vinho, gente indo e vindo, gente sumida aparecendo, gente sumindo. Em meio aquilo tudo, ela dançava como uma criança tímida e desengonçada, ou feito uma mulher sensual e misteriosa, que deixa curiosidade em cada passe, não dava pra definir direito. Não tinha nada de romance ali, éramos desconhecidos de apenas "oi" afinal, mas novamente arrisquei me aproximar, pois me parecia ser a pessoa mais próxima a mim naquela noite. Fingindo que não a via, que não havia nada demais naquela festa, embora ela já fosse tudo, eu a observava de canto de olho, ela parecia não querer nada com ninguém, só dançar, beber, curtir, viver, morrer. Cansada, talvez, ou embriagada demais, sentou-se ao meu lado, nos olhamos por algum tempo, alguns beijos nas mãos, completamente bêbados. Beijos e olhares alcoólicos, como se nos conhecêssemos há muito tempo e não precisássemos dizer nada, eu cá, ela lá.

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